23 Jun 2009 @ 10:06 AM 

Lembro-me de um dia ter perguntado a minha mãe o porque de se tapar o rosto de uma pessoa que morria na rua, em público. Ela respondeu-me que isto se fazia em respeito a privacidade daquele indivíduo que não deveria ter o seu sofrimento exposto publicamente, principalmente naquele momento, pois a morte exigia a dignidade. Acho que compreendi, naquela hora, mas me colocou ao longo da vida muitas questões.

Sempre quis saber porque eram proibidos para crianças os filmes com cenas de violência, principalmente quando mostrava-se sangue. Lembro-me que este era um dos critérios dos juízes de menores na hora de classificar a idade mínima para se assistir a um filme. Tinha esta dúvida já que a primeira coisa séria que mostravam a estas mesmas crianças era a imagem de um homem morto, pregado numa cruz, ensanguentado da cabeça aos pés. Quando eu via aquela imagem forte, a  única coisa que pensava, lembrando-me dos ensinamentos de minha mãe, era que aquele homem não teria merecido a dignidade em sua morte.

Mas depois, quando cresci, estudei e aprendi mais do que aquilo que gostariam que eu soubesse, soube que algumas mortes, para serem didáticas, eram feitas até mesmo no centro de praças públicas, como se de um show aquilo se tratasse e com crianças a assistir. Descobri que afinal, a morte pode ser indigna desde que ela sirva de alguma coisa aos que ficam. Se dela se puder retirar algum proveito, a dignidade do morto deixa de ter importância. Talvez tenha importância para os familiares mais próximos daquela vítima, mas para as pessoas as quais aquele corpo ensangue pode representar algum benefício, não há nada, nem humano nem divino, que faça com que respeitem a privacidade.

É como se mostrassem, com a exposição do sofrimento de uma pessoa, que as suas ideias tem razão ou que são mais fortes do que a daqueles que alegadamente matam, independente da própria vontade do morto em se expor como mártir, naquele momento em que não pode opinar. Aquela morte passa a ser propriedade da causa.

Poderia aquela pessoa estar casualmente a passar por uma manifestação qualquer, mas fosse morta naquele momento, transforma-se-ia imediatamente em ícone da reivindicação dos que se manifestam. Consigo ainda imaginar que poderia, até mesmo, ter sido morta pelo simples fato de ser bela e exibir este predicado onde isto é proibido. Poderia (por que não ?) ter sido morta pelos próprios manifestantes, por ser bela, por não usar o véu, por, com sua beleza e não mais do que isto, argumentar silenciosamente a favor da causa. Sei que somos capazes disto. Já o vi antes.

A dignidade na morte é relativa. Se ela é preservada pode representar que esta perda somente causa a natural dor nos que perdem aquele ente, pais, filhos, companheiros, etc. Mas dependendo das circunstâncias em que se morre, a imagem da morte pode transformar-se em ícone, modelo, símbolo. Por maior que seja o sofrimento provocado com a exposição desta imagem naqueles que verdadeiramente amam o morto.

E pensar que a exposição daquela morte tem mesmo é o objetivo de causar impressão e fixar na mente de todos aqueles que vem aquela imagem forte, para que não se esqueçam jamais, não do morto, mas da causa.

Fala-se hoje em dia na possibilidade da pessoa se expressar em plena consciência sobre a sua vontade em ter a vida preservada por instrumentos ou se aceita de bom grado a eutanásia. Acho que deveriam abrir um espaço também para que as pessoas dissessem se querem ou não ser transformadas em ícones de uma causa qualquer, caso venha a morrer em circunstâncias interessantes a esta causa.

Isto tudo devido a idiota mania que temos de ver as coisas somente com os nossos próprios olhos, só pensando realmente no outro, na medida em que este outro nos sirva para qualquer coisa.

PS: Confesso que aquilo que disse aqui ontem foi por intuição. Imaginei tudo aquilo quando disse “Poderia …”. Porém, de certa forma, e até com precisão, acertei na maioria das coisas que imaginei. Sorte e um pouco de influência dos 50 anos que estou aqui a ver coisas e mais coisas. A confirmação da história pode ser encontrada na edição de hoje (24/06) do  Público, de onde destaco a importância da criação do mártir na cultura iraniana. Foi inclusive motivo para o Marco “Bitaites” Santos destacar em seu blogue a propriedade do que aqui expressei, blogue este onde nasceu a motivação  para o postal e de onde vem a inspiração para este aqui.

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 24 Jun 2009 @ 08:40 PM

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 22 Jun 2009 @ 9:55 PM 

Hoje, a conversar sobre diversas coisas com meu filho mais novo, a propósito da dificuldade da convivência pacífica entre as pessoas, dei o exemplo da dificuldade da coexistência de dois génios num mesmo grupo musical por muito tempo. Falei-lhe das dificuldades de Paul McCartney e John Lennon, a partir do momento que este deixou de ser o ídolo daquele, que descobrira que sabia fazer músicas como nenhum outro nunca soube fazer. Das dificuldades de David Gilmour e Roger Waters em fazerem caber os seus imensos egos na mesma sala (afinal dois corpos não ocupam o mesmo lugar num espaço).

Falei dos problemas de Jon Anderson, Chris Square, Steve Howe, Rick Wakeman e Bill Brufford (sem esquecer do Eddie Offord) em sobreviver a mais de 3 fabulosos discos, únicos até hoje que arrebataram todos os prémios de melhores enquanto músicos individuais e de grupo de rock, tanto na maior revista europeia de música da época, Melody Maker, quanto da sua congenere norte-americana, a Billboard, no mesmo ano, quando do lançamento do fabuloso Close To The Edge, motivo de uma relativamente recente edição da Melody Maker sobre a façanha, quando o Yes festejou 35 anos de carreira, mas raras vezes com esta formação.

Passei por Phill Colins e Peter Grabiel, é claro, não me esquecendo de Eric Clapton, Jack Bruce e Ginger Baker (imagina, 3 génios juntos, impossível!). Mas acabei a conversa no impossível acordo de paz entre Fred Durst e Wes Borland, para descobrir afinal de quem teria sido a culpa pelo fabuloso Chocolate Starfish and the Hot Dog Flavored Water, um daqueles 24 que escolhi levar pra tal ilha deserta ocupada por simpáticos cidadãos.

Para ouvir se serão capazes de imitarem a si próprios, porque parece que perceberam que o o que criava genialidade era a reunião de ambos e não a separação, eclodida dias antes daa arrasadora premiação do disco nos Awards da MTV, quando um solitário Fred Durst apareceu a cantar acompanhado por nada mais, nada menos que de Jimmy Page (não, não me esqueci do Robert Plant), como quem diz a Wes Borland: “Guitarristas bons há muitos por aí. Quero ver é encontrares um louco como eu.” Mas faltava as interpretações teatrais, máscaras e fantasias Gabrielianas do genial Wes.

Voltaram!? Ainda há esperança em que voltemos a ouvir música fresca. Tomara.

A idade é foda! Já neste regresso, na recente turnê pela Alemanha, tiveram que dar um valente “slow down” na Boiler porque não há garganta que resista a tanta energia, Robert Plant que o diga. É uma pena, perderam a melhor parte das vidas deles em parvas discussões.

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 24 Jun 2009 @ 03:36 PM

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 22 Jun 2009 @ 4:19 PM 

Escrevo ficção há cerca de 35 anos. Já escrevi profissionalmente para Teatro e escrevo contos e romances de vez em quanto. Não questiono o mérito nem a qualidade, mas tento perceber alguma coisa da fabulosa arte de escrever.

Mas hoje tive uma dúvida: seria uma das diferenças entre o jornalista e o escritor de ficções a falta de imaginação, ou sobra dela, em um ou outro?

Esta dúvida assolou-me hoje, depois de concordar com o conteúdo de um post num blog de um jornalista, instei-o a “imaginar” uma situação diferente daquela a que ele narrara com brilhantismo.

Parece-me que ficou azedo, pela resposta que me deu, dizendo-me nem passar pela cabeça dele qualquer coisa diferente daquela a que as imagens, e seus autores, mostravam acontecer. Não podem os jornalistas imaginar? Ou só o fazem quando escrevem romances de ficção?

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 22 Jun 2009 @ 10:38 PM

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 21 Jun 2009 @ 3:46 PM 

Há diversas maneiras de se travar uma guerra. O tratado de Versailles tentou regulamentar algumas coisas tentando dar um carácter mais polido a carnificina.

Desde a II Guerra Mundial que os países tem tentado encontrar guerras menos caras, em mortes, não em dinheiro. E uma das formas mais em prática nos dias de hoje é enfraquecer ao máximo o inimigo economicamente, através de prévias sanções aprovadas no concelho de segurança da ONU, como foi feito durante anos com o Iraque, entre as duas tempestades, como a que se fará agora com a Coreia do Norte.

Outra forma muito utilizada de se enfraquecer um inimigo, ao qual não se pode atingir economicamente por ser muito rico, é atingi-lo em suas convicções promovendo cisões internas. Foi assim que derrubaram a antiga União Soviética. Como se faz agora com o Irão.

Mas será o Irão um inimigo? Não fosse não estaria cercado de tropas norte-americanas por todos os lados e em plena ebulição pública que questiona o próprio carácter da revolução islâmica Persa que derrubou o regime do Chá e estabeleceu uma autocracia religiosa islâmica.

Terá razão Fukuyama, e Hegel, sobre o fim da História? A memória de Maio de 68 provocada pelas imagens hoje divulgadas sobre as manifestações no Irão, apesar de proibidas, será o prenúncio de que também por lá caminha-se de forma dolorosa para a democracia ocidental?

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 21 Jun 2009 @ 04:01 PM

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 13 Jun 2009 @ 3:45 PM 

Na Natureza existe um conjunto de leis que regula as relações entre os indivíduos. O desrespeito a estas leis, de forma voluntária ou involuntária, leva aos indivíduos ou grupos, a marginalização. No caso do grupo social a marginalização leva normalmente a impossibilidade de circulação livre do indivíduo ou o seu afastamento, podendo, em casos extremos, levar a eliminação do indivíduo desrespeitante da lei. Na natureza ocorre a mesma coisa, sendo que a seleção natural é até mesmo mais dura para com aqueles que desrespeitam os padrões naturais, levando a extinção dos indivíduos e/ou grupos com muito mais frequência.

Mas isto tudo para afirmar que as leis, naturais (criadas pela Natureza) ou artificiais (criadas pelos homens) por mais objetivas ou subjetivas que sejam, são condições importantes na sobrevivência de espécies.

Uma das leis mais admiráveis e inexoráveis que conheço é a chamada lei da oferta e da procura, ou demanda, que determina o valor de qualquer coisa tomando como base a sua relação entre a procura e oferta.

Neste caso a oferta é única, só existe um Cristiano Ronaldo, e a demanda também, só existe um Florentino Peres, sexto homem mais rico da Espanha segundo a Forbes, disposto a pagar o que for para satisfação de seu desejo de ter aquele específico jogador.

E é isto, somente isto, que determina o valor desta transação. Quanto vale o Cristiano Ronaldo para o Pinto da Costa? Nada, € 0,00. Simplesmente está fora de seu alcance e por isto nem mesmo é desejado enquanto presidente de um clube que não tem capacidade financeira para arcar com o salário estratosférico de nenhum jogador. Lembro me aqui quando lhe ofereceram o Júlio Batista por um preço acessível aos cofres de um Porto recentemente campeão europeu, mas que tornaria desequilibrada a balança de pagamentos dos salários dos jogadores, criando mais instabilidade do que sucesso, segundo o próprio presidente do FCP.

Lembro-me também de um clube que recentemente fez em avanço um investimento significativamente arriscado a procura de um único objetivo, aquele que atingido cobriria o custo do investimento, mas que não atingido levaria o clube a uma situação bastante desconfortável no que diz respeito a manutenção daquela equipe que constituíra e, principalmente, quanto a investimentos futuros. (Acredito que não preciso dizer que esta equipa veste-se de vermelho e que o objetivo não foi atingido). Nunca vi o Pinto da Costa fazer isto e sei que é este tipo de atitude profissional que leva o clube ao qual dirige ao conjunto único de sucessos atingidos, tudo dentro de seu orçamento possível.

Basta verificar que um dia o mesmo Florentino Peres quis Zidane, Figo, Beckham, Ronaldo e simplesmente pagou por isto. Dois deles as maiores transações em sua época, da mesma forma que Cristiano Ronaldo e Kaká agora. Ganhou muito pouco a nível de competição chegando mesmo o time a ser ridicularizado por sua torcida diversas vezes, mas o negócio deve ter valido a pena uma vez que se repete.

Mas quanto custaria o Messi? Teria Florentino Peres euros suficientes para paga-lo? Acho que não. Neste caso pode até existir demanda, mas não há oferta o que faz com que o valor simplesmente não exista. Não é igual a zero, simplesmente não existe.

Esta pergunta poderia ainda ser feita da seguinte forma: qual o valor do Ricardo Carvalho? Altíssimo, poder-se-ia responder, depois dele ter passado pelo Porto que viu nele a capacidade de atingir este valor, como faz agora com Cissokho, que possivelmente será vendido por mais de 40 50 vezes o valor de sua compra (como se o Cristiano Ronaldo tivesse sido comprado ao Sporting pelo MU por “apenas” € 2.300.000 1.860.000 e não os cerca de € 17.300.000 que custou (pouco mais da metade do preço de Pepe ou Anderson)). Poderia ainda citar Deco, Maniche, Bosingwa, Pedro Mendes, Nuno Valente, Marcos Ferreira e tantos outros. Mas porque citei especificamente o Ricardo Carvalho? Porque foi comprando por uma ninharia ao Alverca incapaz de verificar o real valor futuro daquele jogador. Quem era o presidente do Alverca naquela época? O mesmo idiota que hoje preside um clube que faz a mesma barbaridade com o Fábio Coentrão. Aquele mesmo imbecil que acabou com a carreira do Makukula, do Mantorras, do Quim, do Moreto, do Moreira e de tantos outros.

Quanto vale um jogador de futebol? Depende única e exclusivamente da oferta e da procura, e da capacidade de um clube em elevar ao máximo esta relação a seu favor. Mérito do Manchester United, mérito do Futebol Clube do Porto e, porque não, da fabulosa escola do Sporting Clube de Portugal, formadora de 2 dos 5 jogadores mais caros de sempre. O resto é brincadeira, entretenimento, SADismo.

Normalmente os que não sabem, ou não conseguem, reger-se pelas leis, neste caso as do mercado, são extintos. Depois que vi a GM falir, acredito em tudo.

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 18 Jun 2009 @ 05:31 PM

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 10 Jun 2009 @ 11:36 AM 

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 10 Jun 2009 @ 11:38 AM

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