09 Set 2009 @ 9:37 AM 

Está a trovejar. Muito forte. Os alarmes dos carros disparam como se Deus os balançasse com seu arroto.

Raios iluminam momentaneamente os meus pensamentos, como sempre acontece nesta situação.

Fico a pensar nos humanos, aqueles pobre animais que se depararam, há milhares de anos, com a inexorável e assustadora força da natureza. A medida desta força se mostra arrasadoramente inofensiva. Chego a sentir, como eles sentiram, todo o chão a tremer. Assusta sim, mas eu sei o que é e sei que existe apenas uma pequena possibilidade disto fazer mal a mim ou aos meus, protegidos que estamos dentro de nossas cavernas de concreto.

Está a chover, muito forte. Aos homens da terra que conhecem o mar, talvez até pareça que será desta vez que as águas superarão definitivamente as terras. E penso: E eu? Virarei algum peixe? Um raio assustadoramente perto me faz querer ser este peixe.

Observo as pessoas e os animais. Eles se calam. Olham para o céu. Resmungam por vezes algumas coisas ininteligíveis. Estará aquele cão da vizinha a rezar?

Muito barulho, os vidros estremessem. Ainda bem que nas cavernas dos antepassados não havia vidraças. Se não, o medo e a crença na superioridade de um ser que provocaria em sua cólera todas estas manifestações, seria ainda maior, mais forte e condicionante.

Chove. Muito forte. Mas a senhora vizinha segue para o seu carro de baixo de chuva. Não há alternativa. Ela tem que sair de sua toca e ir para outra. Para a toca do patrão, talvez. Ou para a toca do médico, do advogado, do dentista, quem sabe?.

A distância entre as luzes dos raios e o som do trovão já é maior novamente. Eu sei, e somente eu sei, mas eles não sabiam que isto significa que ela já se afasta. Mas o medo genético de meu antepassado não. Ele permanece presente. Até mesmo milhares de anos depois.

As crianças. Elas se assustam e dizemos: “Não é nada, são só trovões.” Mas como não é nada? São trovões. Muito fortes, muito significativos de que afinal há mesmo algo que nos supera em muito e está vivo. Está presente e pode se manifestar a qualquer momento. E pode mesmo levar aquilo que me é mais caro, minha pobre vidinha de observador de trovões.

Ainda há trovões. Estão distantes, mais distantes, mas o medo e a certeza de que eles existem não desaparece assim tão fácil, em tão poucos anos, milhares de anos.

Penso, do fundo de minha caverna: Quem passou por aqui? Por que fez tanto barulho? O que isto tem a ver comigo? Eu não lhe fiz nada de mal? Por que ele me assusta assim? Terei eu feito alguma coisa de mal? Estará ele desta vez apenas me avisando que é poderoso e que pode acabar comigo e com minha família no momento que quiser? Num piscar de olhos, na velocidade do raio? Terei eu agora, daqui pra frente, que policiar os meus atos afim de afastar este monstro de minha mente? Quem é ele? O que é ele?

Já passou. Engraçado. Rapidamente passou. Mais rápido do que eu esperava. Já até vejo o Sol. Foi ele… deve ter sido ele… o Sol… preciso dar-lhe um nome que signifique todo este poder expresso em meu medo.

Já sei: chamar-lhe-ei Deus. E assim o faço desde a milhares de anos.

Um último trovão se manifesta. Distante. Só para me lembrar que ela pode voltar e o fará sempre que quiser. Sem que eu deseje, espere, anseie.

Ok, deixe-me voltar ao jogo de pôquer…

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 09 Set 2009 @ 06:47 PM

EmailPermalinkComentários fechados em A tempestade
Tags
 13 Ago 2009 @ 4:15 AM 

Estátua da LiberdadeEu sou livre! Sou livre! Sou livre para ser gente civilizada, sou livre para ser o que quiser, dentro daquilo a que me deixam escolher.

Sou livre para torcer para o clube que eu quiser, para ir a estádios e pagar para assistir ao futebol. Sou livre para pagar as apostas esperançosas de ganhar milhões que não mais acabam todas as semanas. Aliais, sou livre para gastar o dinheiro que sobra, do dinheiro que ganho com meu trabalho, naquilo que eu quiser.

Sou livre! Sou livre! Posso escolher em quem votar, da esquerda à direita, do Portas ao Portas, que é o mesmo que dizer de leste a oeste. Mesmo sabendo que não há nada nem a norte, nem a sul, nem a sudeste, nem a noroeste, nem em mais lado nenhum, posso votar da esquerda à direita. Sou livre como uma estátua.

Sou livre! Sou livre! Posso falar a mesma língua que meus vizinhos, posso me vestir como eles, posso ter a mesma religião que eles, posso ser da mesma cor deles, posso ser tolerante e politicamente correto com eles. Sou livre, inclusive, para discriminar, se eu quiser. Posso até dizer bom dia, boa tarde e boa noite pra eles, o que é tão belo. Sou livre para estar completamente nu em meu banheiro!

Sou livre! Sou livre! Posso ter um carro, um fogão, um frigorífico, um ar condicionado, vários aparelhos de televisão, vários computadores. Posso gastar energia a vontade. Posso até ter aqueles porta retratos modernos que ficam mudando entre as minhas fotografias prediletas, no tempo em que eu quiser, mesmo que para lá eu não olhe. Sou livre para imaginar o que eu quiser. Sou livre para sonhar!

Sou livre! Sou livre! Posso beber água, respirar o ar, andar na terra, fazer o pão, rever amigos, olhar para o céu, pagando somente parte daquilo que sobra do tal dinheiro que ganho. Posso até abrir e fechar a porta de minha casa quantas vezes eu quiser! E mais: posso fazer cocó e xixi quando eu quiser.

Li este texto para um índio que conheci. Perguntei-lhe o que achava do tom jocoso de minhas palavras. Ele respondeu-me que também podia fazer cocó e xixi quando quisesse, mas que no resto, não sabia do que eu estava a falar. Eu sou livre! Sou livre!

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 13 Ago 2009 @ 11:26 PM

EmailPermalinkComentários fechados em Eu sou livre! Sou livre!
Tags
 30 Jun 2009 @ 3:49 PM 

As coisas:

1. Se as notícias que se tem são de 0 ocorrências, a primeira notícia de uma ocorrência é uma subida de 100%. A segunda notícia, ocorrida dias depois, então, e em relação a primeira, é de um aumento repentino para 200%. Falo isto pensando que se não se tinha notícias de avião caindo nos oceanos, ouvir a segunda notícia em poucos dias, em quedas causadas pelo mau tempo, me fazem crer que o tempo está mais mau do que nunca. Cairão mais? Aguardemos…

2. Se a falta de condições de segurança é condição para uma obrigatória batalha entre torcidas rivais, será somente as condições de segurança que fazem com que as batalhas não aconteçam? Onde estamos? São ainda as extintas muralhas os únicos artifícios para nos manter em segurança? Somos bárbaros, selvagens que precisam ser controlados por forças policiais para não entrar em conflito? Onde estamos?! Século XXI ?! Não me parece.

3.  Ontem, ao assistir ao jogo da final do campeonato europeu de seleções de futebol sub-21, notei que a maioria dos jogadores ingleses eram negros e que a maioria dos alemães eram de cabelos e olhos escuros, sendo mesmo um deles negro. Estará a se operar na Europa uma já visível mutação racial? Em minha opinião isto é mesmo inevitável, com a queda da natalidade europeia e subida das economias, apesar destas crises. Mais e mais pessoas de outras origens tem que ser absorvidas para cumprir a necessidade de mão-de-obra que garanta o crescimento económico. Isto está a transformar a face do europeu. Só falta agora ver um negro na seleção da Argentina.

A Fábula

Era uma vez, um rico distraído. Um dia resolveu guardar umas moedas de ouro dentro de uma bolsa e ir passear. Depois de algumas horas de passeio, entrou num sítio onde estava escrito em letras gigantescas: “Misericórdia. Tudo aqui dentro deste espaço é teu, infeliz miserável que o destino condenou a pobreza. Pode ter o que quiser, desde que nos peça. Se lhe for apropriado, lhe será dado”, e colocou a sua bolsa no chão, sem dar atenção ao que estava escrito, não fosse ele um rico distraído. Foi refrescar-se na fonte de água ali perto, mas onde não poderia ver a bolsa.

Um destes pobres que sempre iam aquele local buscar uma dádiva, carregava todos os seus pertences numa das mãos. Viu a aquilo e pensou que era exatamente o que precisava. Pegou a bolsa, colocou lá dentro os seus poucos pertences, sem ver as moedas, e partiu sem dar notícia. Pensava que não teria feito mal a ninguém, já que aquela dádiva, a bolsa, era mesmo tudo o que precisava.

O rico distraído quando voltou ao sítio onde tinha deixado a bolsa, gritou com todos os seus pulmões:

– Fui roubado! Fui roubado!.

Um dos misericordiosos, ao ouvir os seus gritos perguntou:

– O que houve, senhor rico distraído?
– Deixei aqui uma bolsa com umas moedas de ouro dentro e alguém as levou! Fui roubado! Fui roubado!
– Mas aqui é um sítio onde as pessoas que tem alguma sobra, depositam suas coisas para que outras, mais necessitadas, possam vir buscar. Se o senhor aqui deixou uma bolsa, um outro pode a ter levado, mas isso não é roubou. Está ali escrito que podem levar tudo o que está aqui.
– Escrito… onde?!… Misericórdia?!
– Sim, o senhor foi misericordioso. Fez hoje um pobre muito feliz.

E todos riram muito e viveram felizes para sempre, menos o senhor rico distraído.

Gostaram da fábula? Sim? Pois é, não foi bem assim, mas vi isto acontecer hoje de manhã. Não havia lá ouro dentro da bolsa, mas houvesse, o pobre estaria um pouco mais feliz agora. Jogou o material de trabalho do técnico da Vodafone fora, mas a bolsa lhe serviu as mil maravilhas. Tão felizes são as pessoas misericordiosas.

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 30 Jun 2009 @ 05:10 PM

EmailPermalinkComentários fechados em Três coisas e uma fábula
Tags
 24 Jun 2009 @ 1:38 PM 

Imagine:

Se num estado de primitiva ignorância você não sabe o que fazer para conseguir alimento. Para satisfazer a mais básica das necessidades para se manter vivo, não consegue ver como dominar a natureza de forma a se alimentar. A única coisa que sabe é que por vezes tem abundância, mas por outra profunda penúria que mata, principalmente, os mais fracos, ou seja, os teus pais e os teus filhos.

Se eu aparecesse e te dissesse assim: -”Tenha calma. Não se desespere. Eu sei o que você tem que fazer. Uma ave mágica (*) veio dos céus e me disse. Não acredita? Faça, tente fazer, o que te digo. Se funcionar e você e os seus deixarem de sofrer, acredite então no que te digo. Quer tentar? Então faça assim: trabalhe quando e onde eu te disser para trabalhar. Numa parte de teu tempo trabalharás na construção de monumentos em honra daqueles que te garantirão a vida, no resto dele, mas no momento em que eu te disser, trabalharás na terra pois logo a seguir a ave mágica se encarregará de irriga-la com suas lágrimas. Ela chora por nosso sofrimento. Isto garantirá todo o alimento para você, para todos os seus e para sempre. Mas desde que me entregue todo o produto do teu trabalho, para que eu o guarde e o faça multiplicar, com a ajuda da ave mágica. Só eu posso fazer isto, pois sou o agente transmissor da voz e da vontade deste magnífico ser. Mais tarde, se ver que eu estou certo, acredite então em mim, caso contrário chame-me de louco.”

Você aceitaria o desafio? Se aceitasse, por que outros o fizeram e te garantiram que funciona mesmo, e afinal também funcionasse contigo e você não compreendesse porque, chamar-me-ia de Deus? Talvez. Mas no Antigo Egito funcionou e isto proporcionou que milhares de pessoas durante muitos anos acreditassem que um ser humano, o faraó, era um Deus na Terra e os monumentos construídos por esta lógica foram dos mais belos e maiores de sempre.

Por que? A história era muito credível ou mesmo muito bela? Não. Funcionou porque a tal ignorância primitiva era muito grande.

Sempre digo aos meus filhos que neste mundo há duas espécies de pessoas, as que mandam e as que obedecem. “Estudem”, digo eu, “pois terão uma hipótese de ser um daqueles que mandam”.

(*) Se qualquer espécie de ave mágica é colocada neste enredo, ou em qualquer outro contexto, é só para que o ouvinte não acredite que se eu consegui descobrir aquilo com minha própria cabeça, talvez ele também o conseguisse. O ser divino sobre o qual eu (o personagem) sou o único a ter acesso, tem somente este propósito.

Filho, se eu o coloquei a estudar num colégio religioso cristão, não foi para que se convertesse naquilo que o neguei converter automaticamente ao impedir o teu batismo, mas para que soubesse exatamente aquilo no que não acredito.

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 25 Jun 2009 @ 02:09 PM

EmailPermalinkComentários fechados em A arte primitiva
Tags
 12 Mai 2009 @ 10:56 PM 

Never let go – Camel

Crazy preachers of our doom
Telling us there is no room.
Not enough for all mankind
And the seas of time are running dry.
Don’t they know it’s a lie…

Man is born with the will to survive,
He’ll not take no for an answer.
He will get by, somehow he’ll try,
He won’t take no, never let go, no…

I hear them talk about Kingdom Come,
I hear them discuss Armageddon…
They say the hour is getting late,
But I can still hear someone say,
This is not the way…

Esta letra é de uma música do primeiro disco do Camel, lançado em 1973. Bela maneira de começar,  parece que foi escrita ontem.

Never Let Go

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 12 Mai 2009 @ 11:24 PM

EmailPermalinkComentários fechados em Uma bela maneira de começar
Tags
Categories: Micronarrativa
 

O fim

 
 20 Abr 2009 @ 10:00 AM 

O fim tem sido um factor determinante em todos os meus passos, desde o princípio.

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 20 Abr 2009 @ 04:35 PM

EmailPermalinkComentários fechados em O fim
Tags
Categories: Micronarrativa

 Last 50 Posts
 Back
Change Theme...
  • Users » 2
  • Posts/Pages » 169
  • Comments » 27
Change Theme...
  • VoidVoid « Default
  • LifeLife
  • EarthEarth
  • WindWind
  • WaterWater
  • FireFire
  • LightLight

.eu



    No Child Pages.

Objetivo



    No Child Pages.