25 Out 2009 @ 10:27 AM 

Homo SapiensAcabo de assistir uma gravação que fiz da Odisseia, de um recente documentário da BBC (2009) sobre a ocupação pré-histórica da Europa. Um entre os diversos pontos que abordaram, dizia respeito a prevalescência do Homo Sapiens e da extinção do Homem de Neandertal.

As primeiras teorias diziam que os nossos antepassados diretos detinham maior capacidade intelectual e por isto maiores capacidades alimentares. Alguns preconizaram que fosse mesmo o confronto entre as duas espécies primas que determinaram o desaparecimento da segunda.

Mas neste excelente documentário levantaram outra hipótese, que é concordante com outras coisas que já li anteriormente, principalmente com Gordon Childe entre outros, em que o que haveria determinado a continuidade de nossa espécie foi a nossa capacidade nata de fazer arte e de construir, o que chamaram no documentário, de redes sociais.

A descoberta de uma flauta, talvez o mais antigo instrumento musical encontrado, entre outros instrumentos encontrados anteriormente, o que pressupõem a existência de uma bem estabelecida tradição musical, para além das diversas pequenas esculturas e desenhos, que pela semelhança (principalmente das Vénus) encontradas ao longo de toda a Europa de a 35.000 anos, deixa transparecer uma característica marcante de nossa espécie que é a da transmissão, conservação e passagem de uma cultura comum que estabelece, fortalece e solidifica uma sociedade humana europeia, mesmo antes de existir o conceito de Europa.

Este estabelecimento e difusão de uma cultura num tão largo espaço teria sido um dos factores determinantes para o sucesso desta espécie em detrimento de nossos primos, que detinham basicamente a mesma tecnologia na criação de ferramentas e mesma capacidade de obtenção de alimentos, porém viviam em pequenos grupos isolados entre si.

Portanto, as redes sociais são antes de mais nada uma característica humana, bem como a busca pelo desenvolvimento da tecnologia de comunicação que estabeleça estas redes. Todos os mecanismos de comunicação desenvolvidos a partir da massificação da tecnologia digital, fazem parte de um processo ancestral, por que não dizer instintivo, do ser humano moderno que colonizou a Europa a cerca de 40.000 anos.

Se, na visão de alguns, isto reduz ou deforma nossos seres, é um engano: somos nós próprios a nos exprimirmos de nossa maneira.

Como a língua, o meio de comunicação é dinâmico e está sempre em mutação, mas os que se estabeleceram num dos muitos formatos de expressão de ideias, irão sempre criticar os meios de comunicação que substituem os que foram utilizados no passado. Justifica-se pela tradição, mas não escondendo o medo de ser ultrapassado e de deixar, um dia, de poder se comunicar.

Dos livros que tenho lido sobre redes sociais, o que mais me marcou no presente foi sem dúvida o do sociólogo espanhol Manuel Castells, A Sociedade em Rede. Deste mesmo autor encontrei um artigo interessante que trata do medo que o poder tem da Internet.

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 26 Out 2009 @ 09:48 PM

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 25 Out 2009 @ 9:20 AM 

Mas este tipo de reação é recursivo. Já ocorreu com a televisão e seu enlatamento do conhecimento. Ocorreu na música, como com o CD, onde críticos acusaram Karajan de espremer as sinfonias para caber na média. Já, já aconteceu com os jornais quando comparados com os livros, e com os livros, redutores a aprisionadores de histórias que antes circulavam livremente somente com as palavras.

O desenvolvimento e crítica da massificação da comunicação segue o fluxo da História da tecnologia que suporta a difusão da própria comunicação. E como tudo que é massificante é, necessariamente, redutor, comprimido, condensado de forma a circular para mais e mais pessoas.

E é, principalmente, imutável. O que está escrito assim está e passa a ser um agente classificador de quem o escreve, mesmo que este mude de ideia minutos apois ter escrito. E por saber disso, quem escreve passa a dizer muito menos do que poderia, sob pena de ser acusado de sei lá o que. O próprio processo de massificação, cujo blogue é um exemplo, é redutor por natureza, por ser massificante.

Mas a doença social a que o Pacheco Pereira se refere não passa de um agravamento de uma doença que já existe a muitos anos e que foi a mesma que impediu que os génios da música não sejam encontrados em nossos dias, nesta geração vigente. E quem diz da música diz da literatura, do cinema, do teatro, etc. A arte, expressão popular do conhecimento e forma particular de comunicação, de certa forma se pasteurizou com o advento da TV, primeiro grande objeto tecnológico de comunicação de massa ao nível global.

O ser humano mudou definitivamente desde então, e continua a mudar de uma forma assustadoramente veloz e o resultado disso ainda é completamente imprevisível, acredito. O que somos hoje não é absolutamente o que éramos a 30 anos, nem a 20, nem a 10. A 5 anos nem tantas crianças tinham telemóveis.

O anúncio dos 7M da TMN só indicam que, num mercado de no máximo 10M de pessoas já existe um conjunto enorme com mais que um telemóvel. Para que? Será isto doentio? Será isto apenas mais um erro proporcionado pelos exploradores do mercado que pouco se preocupam com a saúde das pessoas desde que vendam mais e mais dos seus produtos e lucrem mais?

Está tudo a mudar muito rapidamente e ainda não há uma compreensão, uma visão de conjunto, do quadro geral daquilo o que somos e para onde vamos. A velocidade a abrangência da informação nos dias de hoje detona de forma definitiva todo o tipo de “verdade” que foi estabelecido no passado, mas que dependia da dificuldade na circulação da informação para sobreviver enquanto “verdade”. A religião e a política são os mais atingidos por isto.

Mas se estes são dois dos principais pilares da civilização ocidental, o que vem a seguir? É nisso que tenho pensado nos últimos 10 anos.

A real revolução que hoje vivemos está no poder que nos foi dado, pela Internet, em escolher aquilo que queremos ver, ler ou ouvir. Já não dependemos de um intermediário, normalmente corrompido por um sistema que fazia “aparecer” mais o produto “artístico” daqueles que detinham mais dinheiro. Mas a mesma característica democrática que nos permite a liberdade de escolha e/ou produção da própria arte com meios públicos de difusão, abre espaço ao lixo. Temos que ser muito mais seletivos.

A educação tem que mudar. Já não nos serve um modelo professor/aluno onde aquele ensina a estes o que uns outros julgaram ser importante que fosse ensinado. Hoje cabe mais ensinar o desenvolvimento do espírito crítico, para que se possa avaliar a qualidade e/ou propriedade do que se divulga, do que um conjunto qualquer de conhecimentos pré-concebidos para dar “ferramentas” aos cidadãos de amanhã que já não serão aquilo que hoje somos e que aqueles que avaliaram os conhecimentos a serem difundidos eram.

Estamos no meio de uma revolução, onde o revolucionário convive conturbadamente com o arcaico, como em toda a revolução, mas que ninguém sabe exatamente para onde iremos. Não há cabeças da revolução, como um Jean Jacques Rousseau ou Vladimir Ilitch Lenin. Esta revolução é nossa, agentes revolucionários e revolucionados ao mesmo tempo, e que nunca tivemos tanta liberdade e pode para construir o nosso futuro.

A maior crise que esta revolução proporciona é a crise do poder, como citou Pacheco Pereira, e como é Pacheco Pereira.

Foucault de certa forma previu isto no fabuloso Microfísica do Poder, onde ele dizia que o poder não se detêm e que não há divisões entre os que tem e os que não tem poder. O que havia era uma atribuição aqueles que praticavam e exerciam o poder. O que hoje existe, e é esta a força da Internet, é que o poder se expande e atinge a um número muito maior de pessoas que deixam de ser meros espectadores para passar a serem eles próprios produtores e difusores de informação e conhecimento. A opinião hoje é efetivamente livre, como nunca antes foi.

Como uma mensagem no Twiter, este comentário tenta somente resumir algumas das coisas que tenho pensado, visto e estudado. Será que tive o poder de síntese necessário para transmitir toda a abrangência destas ideias.

Concordo com o Pacheco Pereira, há uma doença social grave. Discordo dele no diagnóstico e nas atribuição das causas. É anterior e muito mais abrangente, sendo ele próprio um agente mediático desta pasteurização da informação.

Posted By: Edgard Costa
Last Edit: 26 Out 2009 @ 12:21 PM

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