Por que o sonho terminava
Quando o dia amanhecia
No espelho
Vinha um medo desse gosto morto do passado
Mergulhado na memória
Eu não queria que a vida findasse no abismo desse quarto
Amargando amargurada solidão
Por que a hora se esvazia
Na memória do espelho
Como um fado
Teço o fio do meu sonho cheio de mistério
Um rosário de silêncio
E a minha boca fechada com medo das sombras desses anjos
Que se foram e não voltam nunca mais
Geraldo Carneiro, para música de Egberto Gismonti.
Uma brasileira ofendeu aos portugueses. Carago! Eu tenho dupla nacionalidade. O que devo sentir? Vergonha ou ofensa?
Pensei, pensei e pensei. Concluí então que não devo sentir nada, somente indiferença. Ela, a brasileira, é uma pessoa maior, vacinada, independente e livre. Disse o que disse porque quis e não me consultou antes de dize-lo. Da mesma forma disse-o por estupidez própria e, por ser completamente estúpido, não pode me ofender.
Se eu fosse me envergonhar e/ou me ofender com as coisas que dizem todos os estúpidos que indiretamente me afetam, não faria outra coisa na vida. Dar ouvidos e razão a estúpidos não é um esporte que me atraia.
Ouvir (ler) as reações estúpidas de portugueses a estupidez da brasileira e me ofender com isto, da mesma forma estaria a dar ouvido a estúpidos.
Portanto: + d 100 comentários.
Vou passar a colecionar argumentos. Tem uns que colecionam selos, outros moedas, chaveiros, borboletas, Candida Albicans, etc. Eu colecionarei argumentos.
Talvez não seja nem tão original assim. Acredito que os advogados e os políticos sejam meros colecionadores de argumentos. Mas eu tentarei fazer diferente.
Tentarei colecionar todos os argumentos contra e a favor dos assuntos polémicos de nossos dias, afim de te-los catalogados para ler no futuro e verificar se algum dia alguém chegou perto de ter razão. Principalmente sabendo que com o passar do tempo a discussão vai ficando inócua, irrelevante, transparente como os argumentos passados para os quais já se descobriram outros argumentos contrários.
O motivo da discussão em si não tem nenhum valor. O valor está no argumento, na eloquência, no discurso e, sobretudo, na vitória (vitória e derrota, mais uma forma com que a dualidade se apresenta).
Então, em assuntos como religião, holocausto, futebol, política (o que não é política?), aquecimento global, beleza, Microsoft, Linux, homem na Lua, etc, armazenarei numa memória eletrónica qualquer, porque não há massa encefálica que suporte tanta informação, e os guardarei, sejam eles contra ou a favor.
Não, nunca, pretenderei chegar a conclusão alguma, pois já percebi que ela simplesmente não existe. Mas o fascínio pela vitória das palavras (lembrando-me da descrição do dia do Juízo Final da Bíblia) proporciona argumentos e mais argumentos. Frágeis, sinceros, ignorantes, prepotentes, ambíguos, mentirosos, eloquentes, irrefutáveis, inegáveis, concupiscentes, irritantes, arrogantes, irrisórios, engraçados, inteligentes, inocentes, criminosos, incriminadores e indecentes.
São muitos, variam tanto quanto as intenções imediatas. A mesma pessoa pode argumentar de forma contraditória acerca do mesmo assunto, dependendo da intenção. Só não deve faze-lo para a mesma pessoa, se não vira maluco.
Diversas, muitas, milhões de pessoas podem dizer a mesma coisa durante muitos anos e aquilo estar, verifica-se no fim, absolutamente errado. Mas não esteve durante anos para todos aqueles. O que os faz errado é a vitória de outro ponto de vista defendido com, lá está, outros argumentos. Que pode criar por si só outros dogmas, outras verdades absolutas que se verificarão erradas no futuro. Mas estão sempre certas num determinado momento.
Argumentando-se encontra-se as razões até mesmo de Hitler, Leopoldo II, Чингис Хаан (Genghis Khan, para os íntimos), para quem se quiser. Se não houvesse argumentos eles simplesmente não existiriam. Se não lhes dessem crédito, ou se este crédito fosse medido como o outro, pelos bancos, talvez tanta desgraça não tivesse ocorrido.
Argumentos e mais argumentos. Guardarei-os todos que encontrar. Aliais, pensando bem, é mesmo isto que venho fazendo já há muitos anos. E não sou só eu. Uns fazem mais que outros. Uns tem mais cuidado na escolha e na fundamentação do que outros, mas todos colecionam, apresentam e defendem argumentos. Sejam eles quais forem. Sejam os assuntos quais forem. Tenham ou não relevância para nossa vida imediata. Mas são argumentos e mais argumentos.
Ainda não os coleciono, mas já começo a me fartar.
Eu vivo sempre no mundo da Lua
Porque sou um cientista homeopata
futurista e lunático
Eu vivo sempre no mundo da Lua
Tenho alma de artista sou um génio
sonhador e romântico
Eu vivo sempre no mundo da Lua
Porque sou um aventureiro
desde o meu primeiro passo
no infinito
Eu vivo sempre no mundo da Lua
Porque sou inteligente
se você quer vir com a gente
venha que será um barato
Pega carona nesta cauda de cometa
ver a Via Láctea
estrada tão bonita
Brincar de esconde esconde
numa nebulosa
voltar pra casa
em um lindo balão azul
Pega carona nesta cauda de cometa
ver a Via Láctea
estrada tão bonita
Brincar de esconde esconde
numa nebulosa
voltar pra casa
em um lindo balão azul
Pega carona nesta cauda de cometa
ver a Via Láctea
estrada tão bonita
Brincar de esconde esconde
numa nebulosa
voltar pra casa
nosso lindo balão azul
Pega carona nesta cauda de cometa
ver a Via Láctea
estrada tão bonita
Brincar de esconde esconde
numa nebulosa
voltar pra casa
nosso lindo balão azul
nosso lindo balão azul
nosso lindo balão azul
nosso lindo balão azul
Guilherme Arantes
O ser humano, desde que toma alguma consciência do mundo que o rodeia, ainda na infância, tem sempre pelo menos uma coisa muito clara em sua mente: para tudo há um princípio e um fim.
O dia começa com o nascimento do Sol e termina horas depois. Todos os dias, inexoravelmente. E vemos isto, e tomamos consciência, mesmo que nisso não pensemos.A vida dos animais e das pessoas começam e terminam, nascimento e morte. Um beijo materno começa com o toque da sua boca na face do filho e termina com seu afastamento. O prato de comida termina, o tempo termina, a sede, o frio, o calor, o banho, tudo, tudo começa e termina algures.
A complexa noção de não existência, existência e retorno ao nada, começa a se formar ainda em tenra idade, embora não sistematizada. E talvez seja mesmo isto que nos distingua dos outros animais. Talvez seja mesmo esta a chave para a compreensão de nossa inteligência: temos antes de mais nada a consciência do princípio e do fim. Não me parece que qualquer outro animal tenha a concepção do final das coisas, ou pense de onde ou como se originam as coisas. Tem-nas simplesmente, ou não as tem, mas não preocupam-se em sua existência, do princípio ao fim. Simplesmente tem-nas ou não.
E este é também o princípio do conceito dual que se reflete em tudo o que fazemos e pensamos. Considero isto um defeito nosso, pelo facto de que mais nenhum animal ter esta propriedade.
Se olharmos bem para tudo o que fazemos e pensamos, perceberemos que este conceito dual está sempre presente. E é isto que tentarei discutir aqui nesta série de postais sobre a dualidade.
O próximo que escreverei será sobre aquilo a que os cientistas sociais chamam de dualidade perfeita, que é a conceção do bem e do mal representados nas figuras de Deus e Satanás. Até lá proponho um exercício interessante de reflexão: tentem identificar onde está o princípio da dualidade na Economia, na escrita e na História.
Não tenho muita dúvida e não é por fundamentalismo. Acho que voto no Seara (PSD) aqui em Sintra, sem grandes problemas. Mas para primeiro ministro… Só me resta votar no Partido Socialista.
Do maior partido de oposição, o PSD, não me vem nada que inspire confiança. Para além disso acho mesmo de extremo mal gosto o discurso do país de tanga, dos termos trágicos que a candidata insiste em perfilar. Justo ela que contribuiu sobre maneira, enquanto ministra das finanças, para elevar o déficit de Portugal a níveis descontrolados, seguido por aquelas medidas descabidas (apropriação de capital do fundo de pensões da CGD) para suster o descalabro orçamental.
Sempre nutro uma simpatia pela esquerda, mas não sinto firmeza no Jeronimo de Sousa, a quem vejo mesmo como um romântico ingênuo (deixei de acreditar numa solução de esquerda desde 1991), simpático é verdade, mas sem consistência, pouco eloquente.
O Louçã por vezes me parece ter que fazer algum malabarismo intelectual para manter a coerência ideológica. Acabou por se tornar um mero fiscal da moralidade, sem um discurso claro no que diz respeito a suas próprias ideias políticas, É difícil estar-se na extrema esquerda num mundo onde já não cabem mais tais ideias. Não acredito que alguém ainda veja uma ditadura do proletariado como solução económica. Pelo que li, nem o Marx acreditava nisso.
Na outra extrema, o Paulo Portas não me convence em nada do que diz. Soa falso, politiqueiro, oportunista. Fala de coisas para as quais não apresenta soluções viáveis e que em nada melhoraram quando ele passou por lá, pelo poder. Sei lá, não me convence intelectualmente.
Resta o Partido Socialista. Se adoro o PS? Nem um pouco. Já admirei profundamente o Mário Soares. Mas o Sócrates, que me desiludiu já na campanha passada, quando percebi a quantidade de vezes que ele perde-se naquilo que diz, não me convence na totalidade. O seu discurso é bastante fraco. Perto de um Santana Lopes, parece um menino. Porém este, um mestre do discurso, já não é a mesma coisa no que diz respeito a ação. Daí Sócrates supera em muito o rival. Se a ação é a mais indicada ou não, já é outro assunto que daria postais e mais postais, mas não é este o meu propósito.
O Sócrates é perseverante, determinado, nunca perde os seus objetivos de vista. Porém, estas qualidades todas também podem ser vistas como teimosia. Por um lado é bom, muito bom, mas por outro … nem por isto.
Em minha opinião, não há candidato melhor. Pena que se nivele por baixo. Poderia dizer também que é o menos pior, mas é indiscutivelmente aquele que reúne neste momento as melhores condições para conduzir o país. Já obteve uma forte vantagem política frente ao político Presidente da República, que só me faz sentir saudades de Jorge Sampaio.
Poderia mesmo acrescentar que a atuação de Cavaco Silva reforçam mais ainda minha convicção em votar no PS. E é o que farei, no Domingo, com orgulho de ser português e poder dar minha opinião num país que respira democracia por todos os poros.
Sou um socialista e ainda tenho uma visão romântica do socialismo, que imagino poder ser muito mais do que tem sido aqui em Portugal. Mais justo socialmente, mais progressista no que diz respeito as relações dos indivíduos e suas liberdades incondicionais, mais próximos daquilo a que Mário Soares um dia sonhou, com tanto idealismo quanto eu tive nos tempos de faculdade. Mais preocupado com a vida e com a qualidade dela, menos voltado para o capital e mais preocupado com o humano.
Ainda acredito que haverá um socialismo moderno capaz de revolucionar as relações sociais, mas que é, em minha imaginação, alguma coisa muito diferente do que tem sido hoje. Tentarei abordar melhor este tema em outros postais. E de certa forma o tenho feito ao apontar as artificialidades de nossa civilização que ainda caminha na infância do desenvolvimento social. Voltarei a este assunto, mas por agora vou mesmo é votar no Partido Socialista.
PS (Não, não é propaganda, mas Post Escriptum): E parece que não estou mal acompanhado.
Umas e outras há muitas, menos as primeiras que as segundas, mas sempre há muitas. Na condição especial da adorada virgem mãe, esta é que, se isto for possível, pelo que dizem, só mesmo uma.
Mas uma das explicações possíveis para a história da virgem nos conta que nos tempos de Maria, a mulher que cometesse o adultério era simplesmente apedrejada. Infelizmente, também pelo que contam, isto ainda acontece nos dias de hoje. Consta que o “santo” José, ao voltar de viagem, encontrou a sua muito mais nova esposa, Maria, grávida, possivelmente, de um de seus irmãos mais novos. O “santo” José, para não punir o irmão e a jovem mulher, assumiu aquela história do anjo violador de virgens, mas que por ser anjo não desvirginava a virgem, mas que causava a gravidez na mesma. Coisas banais de “santos”.
De forma geral, ao longo da História, encontramos em vários, quase todos, os agrupamentos sociais maneiras de execrar, banir, punir, ostracizar, o membro que erra. O erro é uma componente inerente da condição humana, mas dependendo do erro, e das consequências para com os nossos semelhantes, a punição é exemplo para os outros, afim de evitar o erro e/ou dar uma dimensão da avaliação a que aquele grupo social dá ao erro.
Hoje em dia já não se pratica o apedrejamento da adultera (imagina se o fizessem!), Mas o apedrejamento ainda é praticado em nossa sociedade ocidental, quase todos os dias e, principalmente, com as pessoas públicas. Aquelas das quais ficam dia e noite à porta de casa, esperando que sejam humanos como nós e façam alguma coisa que, mesmo que não seja nada errada, possa ser dado uma conotação de erro.
Mas quando erram então, estas figuras públicas são mesmo apedrejadas, fuziladas! Já não se usam pedras ou balas, mas perguntas, câmeras e disparos das máquinas fotográficas digitais.
Isto tudo passou aqui por minha cabeça, porque vi uma cena de apedrejamento público feito contra a Serena Willians, logo a seguir a ocorrência do, talvez, aquele que tenha sido o seu maior erro: disse para uma juiz de linha oriental, o que me fez lembrar dos japoneses ou dos vietnamitas, após esta ter lhe marcado uma falta de pé, num segundo saque, o que deu o “match point” a adversária Kim Clijster, disse-lhe que a mataria! Ainda tentou negar isto na quadra, nas explicações aos responsáveis do torneio, mas nada adiantou, foi mesmo punida com um ponto o que deu a vitória a tenista belga.
Os desportistas de alta competição tem um privilégio que poucos tem: a eles é reservada uma sessão de apedrejamento automático ganhe ou perca. É automático e compulsório exatamente para que ele não possa fugir das sessões de conferência de imprensa quando lhe convier, como seria o caso dos dias em que erram como Serena errou. Se fosse opcional, Serena por lá não teria aparecido, Mas como se lá não fosse seria chamada de tudo, de covarde para baixo, lá foi ela ser apedrejada passivamente, como que caminha para um pelotão de fuzilamento. Com dignidade, sempre, mas apedrejada a cada movimento fotogénico, que a envergonha e incomoda. Mas faz parte do show, que afinal deve continuar. Está escrito em seu contrato de milhões de dólares que sempre tem que ir as sessões de apedrejamento, independentemente do tamanho e da direção das pedras.
É impressionante ouvir os arremessos das “pedradas” exatamente nos momentos em que a maior fragilidade “espiritual” se apresenta em gestos com charme e dignidade, porém desajustados para o momento, que deveria ser da mais profunda humildade. Como os lobos ou cães, ela deveria, queriam os fotógrafos, ter aparecido por ali com o “rabo entre as pernas”. Mas ela é a Serena Williams. Seu saldo bancário e seu status social a isso não permitam. Mas que procuram, procuram e lançam as pedras.
Por que do apedrejamento? No momento das palavras, no ato do xingamento, quando agimos desgovernados dos conceitos sociais que nos norteiam o dia a dia, nos reprimem as sensações e nos condicionam as ações para sermos sociais, não há nada que exista a não ser nós próprios e nosso instinto. Não existe Deus, Jeová, Maria… não existe santo nenhum que nos detenha em nossos impulsos humanos. Sejam eles movidos pela raiva ou pelo desejo sexual. Há que depois admitir, assumir os erros e inventar uma desculpa qualquer para nossos atos, porque nos apedrejados de nossa cultura ocidental, a vida continua.
E no final até se saiu bem. 10.000 dólares menos milhonária, mas se saiu bem, imaculada. Disse até que nunca brigara com ninguém… uma santa… fez caras, gestos e poses disto. Daqueles que constam em nosso imaginário social que antes eram eternizados pelos mestres da pintura, mas que agora são feitos pelos fotógrafos.
Está a trovejar. Muito forte. Os alarmes dos carros disparam como se Deus os balançasse com seu arroto.
Raios iluminam momentaneamente os meus pensamentos, como sempre acontece nesta situação.
Fico a pensar nos humanos, aqueles pobre animais que se depararam, há milhares de anos, com a inexorável e assustadora força da natureza. A medida desta força se mostra arrasadoramente inofensiva. Chego a sentir, como eles sentiram, todo o chão a tremer. Assusta sim, mas eu sei o que é e sei que existe apenas uma pequena possibilidade disto fazer mal a mim ou aos meus, protegidos que estamos dentro de nossas cavernas de concreto.
Está a chover, muito forte. Aos homens da terra que conhecem o mar, talvez até pareça que será desta vez que as águas superarão definitivamente as terras. E penso: E eu? Virarei algum peixe? Um raio assustadoramente perto me faz querer ser este peixe.
Observo as pessoas e os animais. Eles se calam. Olham para o céu. Resmungam por vezes algumas coisas ininteligíveis. Estará aquele cão da vizinha a rezar?
Muito barulho, os vidros estremessem. Ainda bem que nas cavernas dos antepassados não havia vidraças. Se não, o medo e a crença na superioridade de um ser que provocaria em sua cólera todas estas manifestações, seria ainda maior, mais forte e condicionante.
Chove. Muito forte. Mas a senhora vizinha segue para o seu carro de baixo de chuva. Não há alternativa. Ela tem que sair de sua toca e ir para outra. Para a toca do patrão, talvez. Ou para a toca do médico, do advogado, do dentista, quem sabe?.
A distância entre as luzes dos raios e o som do trovão já é maior novamente. Eu sei, e somente eu sei, mas eles não sabiam que isto significa que ela já se afasta. Mas o medo genético de meu antepassado não. Ele permanece presente. Até mesmo milhares de anos depois.
As crianças. Elas se assustam e dizemos: “Não é nada, são só trovões.” Mas como não é nada? São trovões. Muito fortes, muito significativos de que afinal há mesmo algo que nos supera em muito e está vivo. Está presente e pode se manifestar a qualquer momento. E pode mesmo levar aquilo que me é mais caro, minha pobre vidinha de observador de trovões.
Ainda há trovões. Estão distantes, mais distantes, mas o medo e a certeza de que eles existem não desaparece assim tão fácil, em tão poucos anos, milhares de anos.
Penso, do fundo de minha caverna: Quem passou por aqui? Por que fez tanto barulho? O que isto tem a ver comigo? Eu não lhe fiz nada de mal? Por que ele me assusta assim? Terei eu feito alguma coisa de mal? Estará ele desta vez apenas me avisando que é poderoso e que pode acabar comigo e com minha família no momento que quiser? Num piscar de olhos, na velocidade do raio? Terei eu agora, daqui pra frente, que policiar os meus atos afim de afastar este monstro de minha mente? Quem é ele? O que é ele?
Já passou. Engraçado. Rapidamente passou. Mais rápido do que eu esperava. Já até vejo o Sol. Foi ele… deve ter sido ele… o Sol… preciso dar-lhe um nome que signifique todo este poder expresso em meu medo.
Já sei: chamar-lhe-ei Deus. E assim o faço desde a milhares de anos.
Um último trovão se manifesta. Distante. Só para me lembrar que ela pode voltar e o fará sempre que quiser. Sem que eu deseje, espere, anseie.
Ok, deixe-me voltar ao jogo de pôquer…
Se o Usain Bolt jogasse Poker e o fizesse com a mesma qualidade com que corre os 100 e 200 metros, modalidade nas quais é considerado por muitos como o melhor de sempre, eu, um mero mortal, teria a mesma possibilidade que ele, sentado numa mesa de Poker.
Se me pusesse a correr lado a lado com o jamaicano, e se o fizesse 100 vezes, eu perderia as 100 porque ele é neste esporte definitivamente melhor do que eu. Poderia considerar que numa dessas 100 vezes, por obra do acaso, ele tropeçasse e caísse ao chão, dando-me a chance de vence-lo uma vez. Mas esta vitória seria um acaso absurdo, que em outras condições não aconteceria de forma alguma.
Se eu jogasse nos próximos dias 100 partidas contra um Grande Mestre de Xadrez, por mais que eu me dedique a estudar a arte e a ciência do Xadrez a partir de um ponto qualquer e nos seguintes dois anos, eu perderia as 100 partidas, porque há um conjunto de conhecimento cumulativos que eu não seria capaz de reunir neste tempo de forma a supera-lo, caso o tal campeão se mantivesse ativo e a estudar no mesmo período que eu. Ele partiria na frente e sempre estaria a minha frente inexoravelmente.
Mas no poker, que alguns querem faze-lo esporte, tudo é muito diferente. Há uma componente de sorte muito marcante que faz com que situações inacreditáveis, e este é o ponto fulcral da questão, possam acontecer com uma frequência determinante.
O que se faz perder na corrida dos 100 metros é um conjunto de capacidades físicas e técnicas absolutamente mensuráveis que determinam de forma segura que o Usain Bolt vá me vencer sempre, dentro das condições físicas que ambos temos neste momento.
O que se faz perder no xadrez é um conjunto de conhecimentos estratégicos que se forem aplicados com precisão pelo adversário não me darão a menor hipótese de vitória caso não as conheça a todas e saiba como evitá-las e transformar-las em possibilidade de contra-ataque. E poderia continuar a falar assim de outros esportes.
Mas o que faz perder no poker é a presunção, a esperança, a crença de que aquilo que temos, ou poderemos vir a ter num determinado momento, é superior ao que o nosso adversário tem ou terá. Mas aí a sorte tem uma influência muito grande para permitir ser absolutamente mensurável a capacidade de uns e de outros.
Tenho a certeza que se o maior jogador de Poker jogar contra mim 100 mãos, e se nessas as cartas me privilegiarem, sou capaz de ganhar algumas vezes dele e, se calhar, com um pouco de sorte, até mesmo mais vezes.
Sim é verdade. Sinto-me capaz de vencer ao Doyle Bruson algumas vezes, mas sei que seria impossível vencer o Usain Bolt ou o Garry Kasparov, nos esportes que praticam.
Este pensamento veio a partir do, a meu ver improvidente, debate do Leo Bello com o Jô Soares a cerca de ser o poker esporte ou não.
A meu ver o Poker não é um esporte e nunca será, não passando de um jogo onde a componente sorte tem uma importância muito grande e onde a consciência deste factor imponderável é condição definitiva para se obter sucesso neste jogo.
O “come quem quer”, “fuma quem quer”, etc. é o argumento utilizado pela indústria alimentar e do tabaco na hora em que são condenados a pagar indemnizações aqueles que sofreram as consequências do processo de massificação de mal hábitos patrocinado pela indústria ocidental. E perdem nas cortes ao utilizar este argumento.
A separação entre os fortes que resistem a pressão mediática e social e os fracos que engordam e morrem das consequências provenientes da massificação de lixo consumista, é um argumento que tem por base a eugenia. Está provado nas cortes e na História.
Fala-se aqui em questões básicas muito sérias do processo de desenvolvimento social pelo qual o mundo ocidental católico (aquele que se habituou a comer carne de porco, lixo para os judeus e muçulmanos) passa neste momento em que se revê todas as consequências da Revolução Industrial, da crise financeira e económica causadas pela massificação industrial que levou a crise de 1929 e a de 2008/2009, aos processos “fast rich” que trazem dinheiro para alguns e sofrimento para milhões.
Em minha opinião todo este processo está errado e tem que ser modificado. Todo o processo de diminuição do custo de produção visando a maximização do lucro, em detrimento da qualidade de vida das pessoas tem que ser modificado. E na indústria alimentar isto se apresenta de forma particularmente cruel, porque atinge diretamente a qualidade de vida das pessoas e, sobretudo, a saúde!
É triste ver um mundo ocidental que cada vez consome mais lixo, e isto se vê na dimensão de seus corpos, enquanto na maioria do mundo morre-se de fome. O alimento consumido por aquela senhora da foto dava para alimentar de forma equitativa pelo menos mais 4 pessoas. Se por cada gordo, sinal efetivo de produção e consumo excessivos, houvesse uma maneira de dividir este alimento em partes iguais, não haveriam nem os gordos nem os que morrem a fome.
Mas que isto fosse feito sem o paternalismo de um estado totalitário. Que fosse feito por mera solidariedade. O problema é que a solidariedade não gera lucro. Portanto é melhor engordar os daqui, dando-lhes muito mais alimento do que precisam, desde que eles tenham dinheiro para pagá-lo, do que utilizar este excedente para alimentar a quem realmente precisa. É como a indústria do dinheiro: só emprestam para quem o tem.
Sinto-me mal, muito mal, quando vejo um manifestante qualquer no mundo ocidental a destruir alimento pelo fato dele não proporcionar o lucro que esperava. Porra! E os que estão a morrer a fome?
Que se canalize as calorias que excedem nos maioritariamente gordos ocidentais para os maioritariamente desnutridos do resto do mundo. Tenho a certeza que todos ficariam mais felizes. Menos os “louros de olhos azuis engravatados” a quem o Lula responsabilizou esta última crise que passamos. Mais uma vez uma crise de excedente industrial. Só que desta vez proveniente da indústria do dinheiro.
É fácil de ver, não é?